Arroz com
feijão é bom demais!
Eu sempre gostei de arroz com
feijão. Feijão preto é claro. Minha mãe era batuta para fazer feijões de todos
os tipos. Era cortado, inteiro, com farinha, com linguiças da roça e um dia ela
nos serviu uma sopa de feijão que entrou para a história. E o arroz? Soltinho,
sempre deixava no fundo da panela uma rapa que eu adorava. Depois casei,
descobri que a Célia era supimpa na cozinha. Seu feijão e seu arroz eram e
ainda é inigualável. Eu tive duas fases na vida que nunca esqueci. A primeira
foi quando casei e trabalhava na Usiminas em Minas Gerais. Ainda morava em Melo
Viana, um distrito de Coronel Fabriciano. Era divertido, pegávamos um caminhão
lonado e viajávamos mais de 40 quilômetros até a usina. Ida e volta, na
carroceria mais de 100 peões. Um belo dia o Francisco que também morava em Melo
Viana e como nós pagava aluguel disse que tinha um plano. Mais dois vieram se
juntar a ele. – Vamos invadir um Galpão de uma Empreiteira na Candagolândia (um
bairro de Ipatinga, próximo a Usina). Já verifiquei um galpão tem oito quartos
e fica dois para cada um. Usamos os banheiros e tanques em conjunto.
Dito e feito. À noite
juntamos nossos trapos, alugamos um caminhão que serviu para os quatro e partimos.
Trabalhamos a noite toda para abrir uma porta de um quarto ao outro. Foi
divertido. Durante um mês ninguém foi lá reclamar. Dois meses depois apareceu o
fiscal. Sujeito valente, ameaçou, disse que ia chamar a policia e coisa e tal.
Não chamou e continuamos lá. Um belo dia apareceu um funcionário da usina. Ofereceu-nos
algumas casas na própria Candangolândia. Casas simples de dois cômodos. O
telhado de amianto quase nos fez desistir, afinal trabalhávamos de turno e
precisávamos dormir de dia. O vale do Aço tem temperatura média de 40 graus. Eu
não discuti. Aceitei os outros não. Tanto ficaram que pegaram casas melhores.
Paciência. Sabe o que eu gostava da Candangolandia? Era proximo ao rio
Piracicaba. Lá eu podia nadar e pescar. Os vizinhos pacatos, gente boa mesmo
tendo que dividir um banheiro e um tanque com quatro.
Nunca esqueci a Célia
me dizendo: - Osvaldo não temos carne. Só feijão e farinha. Vê se pesca uns
lambaris no Rio Piracicaba. Lá ia eu com minha varinha e minha bicicleta. Já
conhecia os pesqueiros. Sentava e em menos de vinte minutos uma fieira com mais
de 50 Lambaris Bocarra. Compridos, fritos uma delicia. Eu não tinha um ótimo
salário. As compras eram feitas na Cooperativa da Usina. Cada um de nós só
podia comprar vinte por cento do salário. Assim as compras só uma vez por mês.
Minha casa tinha uma mesa, quatro cadeiras, um fogão a gás, uma prateleira de
vidro, uma cama e um guarda roupa. Eu tinha também um rádio Philips e em ondas
curtas podia ouvir rádios distantes. Eu gostava daquela vida, o Jan meu filho
mais Velho já tinha um ano e seu sorriso era encantador. Depois vieram as
dificuldades que já contei por aqui. A segunda foi quando fui convidado para
ser o Gerente de uma Fazenda no Norte de Minas. Uma outra vida. Gado que sumia
de vista nas largas e na beira do Rio das Velhas. Com um barco a motor que
tínhamos era coisa de vinte minutos até o São Francisco.
Lá as histórias são
muitas, mas aqui só vou contar à fartura que tivemos. Celia tinha uma bela
horta. Enorme. Antonio Preto ajudava três vezes por semana. Eu dava a ele uma
paga razoável. Tinha de tudo. E o galinheiro? Tantas galinhas que diariamente a
Célia colhia mais de quatro dúzias de ovos. Amigos em Pirapora se deliciávamos
quando chegávamos. Não esquecer o chiqueirinho. Sempre quatro capados
engordando. A cada três meses o Seu Manezinho vinha para matar um. Um fogão
feito de barro, três tachos enormes, carne à vontade. Célia fritava e colocava
em latas de vinte litros com gordura de porco. Uma delicia para comer, era só
tirar fritar e se deliciar. Linguiças? Tantas que em cima do fogão na área
externa da minha casa quase não cabia. Eram sim linguiças de porco legítimas
não essas de hoje. Não esquecer os choriços. Deus do céu! Me dá água na boca só
em pensar.
Mas não era só isto
não, eu vendia de três a quatro vacas mais velhas para açougueiros da região.
Eles faziam questão de quando iam embora (eles mesmo matavam e desossavam)
trazer um bom bocado de um cupim, de um filé
mignon. Enfim era só dizer qual carne e eles traziam. A geladeira não era
grande, era a gás, e eu não aceitava tudo que me davam. E os peixes? A lagoa
que nas cheias o Rio das Velhas jorrava por dias, era farta em piaus, corvina,
belos dourados, grandes surubins. A Célia me chamava e dizia: - Osvaldo, vamos
comer um peixe? Traga um dourado, mas pequeno. Não mais que dois quilos! Lá ia
eu com minha linhada, um pedaço de carne e meia hora depois estava de volta com
o peixe encomendado. Hoje? Bem sempre tenho uma carne na geladeira. Congelada,
nada fresco. Nem se compara aqueles lambaris fritos que nunca mais comi. Nem se
compara com um filé, um cupim, carne de porco a escolher, linguiças, e
choriços. Ah! Eu adoro choriços.
O tempo ficou no passado, mas sempre
é bom lembrar. Eu e Célia nos divertimos muito quando as tardes sentamos em
nossa varanda e começamos a falar das coisas boas da vida, dos sofrimentos, das
mudanças de residência, do escotismo e de tantas coisas. Mas as carnes e os
peixes a gente não esquece nunca!
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