A felicidade existe, e está junto a nós!
Ela se chama Célia, minha esposa querida.
Muitos
insistem em procurar a felicidade sem saber que ela está em nossa mente a todo
instante. Esquecemos que tudo que fazemos tem uma razão de ser, e para isto
encarar de frente e aceitar sem reclamar nos tornamos mais amigos, mais
sinceros e muitas vezes afastamos com isto a arrogância que nem sempre é
observada por nós mesmos em nossos atos. Eu já tive momentos de fraqueza, quem
sabe de desespero e cheguei a ponto de mudar todo meu rumo por um destino que
não era o meu. Muitas vezes esqueci que foi ela quem me deu tudo que sou.
Difícil dizer que para mim que existe uma pessoa melhor que a Celia. Muitos
anos juntos. Discutimos muito, cheguei até a ofendê-la o que não devia, pois
não tinha este direito. Depois me redimi. Vi meu erro e sempre o coloco em
primeiro plano. Torna mais fácil o pedido de desculpas ou de perdão.
Quando a conheci tinha menos de dezenove anos.
Ela fazendo quinze. Não tive outra em minha vida depois que a conheci. O
respeito sempre existiu entre nós. Uma época diferente. Sem a liberdade de
hoje. Certo ou errado foi assim e me orgulho dela e de mim por termos procedido
desta maneira. Se voltasse no tempo seria como foi sem mudar nada. Eu ela nos
casamos novos ainda. Eu com vinte e dois ela com dezessete. Nossa alegria
quando fomos para nossa casinha, não dá para contar. Claro não tivemos lua de
mel. Nem pensar sobre isto. O Dinheiro passava longe. Fomos morar em Melo Viana,
distrito de Coronel Fabriciano. Em uma casinha simples. Dois cômodos. Um quarto
com cama e guarda roupa, cozinha e sala com uma mesa, uma prateleira, um fogão
de quatro bocas simples e mais nada. A luz era mais fraca que uma vela. Um
radinho de mesa que dava para escutar algumas rádios do Rio de Janeiro.
Nacional e Mayrink Veiga. Mas que alegria meu Deus! Quando saia do meu trabalho
na usina contava as horas de voltar e ficar ao lado dela. Horário difícil.
Virava noites. Uma hora e meia em um caminhão lonado com mais de cem peões
usineiros.
Ela sempre
sorrindo. Nunca reclamou. Aceitou minha maneira de ser do escotismo que era meu
segundo amor. Na Usiminas mais de quatro mudanças. Cada uma mais divertida que
a outra. Cada uma com uma história para contar. Invadimos em quatro casais um
barracão abandonado de uma empreiteira no bairro da Candangolândia. Era isto
mesmo. Os outros bairros eram da classe dominante da usina. Não tínhamos este
direito ainda. Cada um escolheu dois cômodos todos de madeira. Foi divertido
morar ali com os demais casais, todos da minha idade. Época de dinheiro curto.
Só arroz e feijão e meus lambaris bocarra que pegava no Rio próximo onde
morava. Depois uma nova casinha até que perdi o emprego. Fomos embora, sem
dinheiro. Um caminhãozinho pequeno coube tudo. Lá fomos nós, eu ela e meu filho
de um ano. Não estávamos triste. Uma parada para almoço. Almoço? Apenas um pão
com mortadela que na época chamávamos de salame e um guaraná. Não dava para
gastar. A epopeia de mudança não parou. Outra casinha em Vitória. Mudança à
vista. Em Belo Horizonte moramos em três lugares. E assim vivíamos aqui e ali.
Reclamar? A Célia? Nunca. Aceitava tudo com muito amor. Os filhos foram
aparecendo. Uma mãe de verdade. Um do lado, outro do outro lado, um no colo e
lá ia ela para o hospital, para a cidade para qualquer lugar. Ônibus? Demoravam
uma até duas horas para chegarem ao ponto. Moramos em cada lugar que não dá
para esquecer! Mas sabe, em todos eles com muito amor. Um belo dia disse a ela
– Fui convidado. Dizem que me pagarão bem. Vamos morar em uma fazenda? Porque
não? E lá fomos nós. Mais quatro anos de pura felicidade. Cavalos, bois, vacas,
jardim, árvores frutíferas, pomar, horta, rio e lagoa piscosos. Uma vida que
ninguém esqueceu.
Quando compramos
nossa primeira TV havia uma duvida. Geladeira ou TV? Risos. Geladeira primeiro
é claro. Dinheiro escasso. Uma sobrinha de dinheiro aqui e outra ali difícil de
arrumar para roupa dos meninos. Carro? Esqueça. Só muitos anos depois. E sempre
ao meu lado a Celia. Incansável. Criando quatro filhos que sempre que podem a
procuram até hoje. Muito mais que a mim. Ela é mais confidente deles que eu. Ela reclamar?
Sim, poucas vezes, mas como era disposta, ou melhor, como ainda é aceitava tudo
com muito amor. Quando fui fazer uma
operação lá estava ela do meu lado. Quantas vezes minhas crises a fizeram
perder noites e noites a me acompanhar em prontos socorros da vida. Varias
vezes dormiu em cadeira simples ao meu lado de um leito de hospital. Que mulher
meu Deus!
Até hoje cuida
de mim com carinho. Nunca me deixou faltar nada. O dinheiro para ela não era
tudo. Fazia falta sim, mas ela sempre aceitou o destino que nos foi traçado,
pois não somos ricos e hoje depois que aposentei dependo de tudo. Dela que
cuida de mim, dos filhos que me ajudam a viver, de hospitais públicos que ela
está sempre disposta a me levar, de passagens de ônibus gratuitas, mas isto
para mim e ela é diversão. Suas obrigações, ou seja, ela sempre pensou que
tinha o seu dever de esposa era e ainda é cumprida a risca. Hoje dificilmente
podemos gastar. O dinheiro que temos não dá. Ela reclamar? Nunca! Sei que tem
seus sonhos, nós dois os dividimos em partes iguais. Às vezes sentamos eu e ela
na varanda e ficamos a criar fantasias de uma viagem, de uma compra extra e
vejo que seus olhos ficam cheios d’água, pois sabe que são sonhos. Somente
sonhos.
Muitos anos se
passaram desde que nos casamos. Em quatro de setembro de 1964. Um de nós vai
partir primeiro um dia. Falamos sobre isto sempre. Eu acho que irei primeiro.
Esta doença pulmonar que tenho é irreversível. Ela não diz nada. Fica calada, mas sabe que
vamos nos encontrar do outro lado. Somos espiritualista. Toda quarta feira e
isto tem mais de vinte anos, fazemos nossas orações, ou melhor, nosso Evangelho
no Lar. Antes com filhos hoje só eu e ela. É sagrado. Mesmo sabendo que estamos
aqui de passagem sei que iremos sentir uma falta imensa um do outro. Mesmo
sabendo que o tempo aqui na terra não é nada comparado ao da eternidade. Todas
as noites deito e rezo. Para ela principalmente. Sei que sua saúde não é das
melhores, mas ela tem uma força que tenho inveja. Mesmo com seus pés muitas
vezes com feridas, pois ela tem erisipela, lá vai ela morro acima sem reclamar
para marcar consultas, marcar exames ou fazer uma comprinha de supermercado. Nosso
carrinho fundiu o motor. Sem chances para arrumar. Nosso transporte hoje é como
brincava no passado. EVV – Empresa de Viação Vulcabrás.
Ainda olha dois
netos durante a tarde para que os pais possam trabalhar. Fica com eles boa parte
do dia. Lição de casa. Refeições. Roupa lavada, passar tudo, não esquece nada.
Fico admirado. Sei que tem muitas mulheres como ela, mas não acredito de forma
nenhuma que tem alguma além dela. Celia, minha esposa, meu anjo minha vida. Amo
você demais. Sei que somos uma família feliz. Quatro filhos, oito netos, um
genro, três noras e quando estamos juntos pode-se notar o esplendor total desta
família. Todos se entendem, todos conversam entre si. E nenhum deixa de ajudar
o outro. Adoro esta família. Colaborei muito para que isto acontecesse. Mas a
Célia foi a maior responsável por tudo. Seu amor aos filhos foi fenomenal. Eles
até hoje sabem disto melhor que ninguém.
Poderia ficar
aqui, a preencher folhas e folhas sobre ela. Afinal temos uma vida juntos.
Passamos por poucas e boas. Quantas coisas para contar, mas prefiro parar. Sei
que ela sabe do meu amor por ela. Da minha admiração e acredito e peço a Deus
sempre que nos mantenha juntos por toda a eternidade. Não sei se vou ser
merecedor, mas peço aos anjos que me deem uma forcinha. Mas como digo sempre,
aceito o que vier. Meu crescimento depende dos céus e de mim. Celia, muito
obrigado. Você sempre foi e sempre será a luz da minha vida!